Alcione Araújo – Um pescador de palavras!

Morreu Alcione Araújo. Alcione cronista, Alcione dramaturgo, Alcione romancista. Mineiro magoado com Minas, Mineiro de nascimento, Alcione tornou-se carioca por muito tempo, e, em Belo Horizonte, nas últimas duas vezes em que estive com ele: na Academia Mineira de Letras e na Sala Juvenal Dias, no Palácio das Artes, por ocasião do lançamento do seu último romance, Ventania, Alcione dizia ao público que os outros Estados o acolhiam melhor que Belo Horizonte. E eu ficava pensando o por quê. Coincidência ou não, quando, em dezembro de 2010, do lançamento do seu livro de crônicas: Cala a boca e me beija, na Academia Mineira de Letras, o auditório da Academia não estava lotado. Naquele mesmo dia, e mesmo horário, no auditório da Cemig, Luiz Fernando Veríssimo e Zuenir Ventura se apresentavam ao público. Depois, na sala Juvenal Dias, em novembro de 2011, a presença de Alcione coincidiu com o show do cantor Roberto Carlos no grande auditório do Palácio das Artes. E fiquei pensando se o Alcione dizia isso pela ausência de grande público…
Certo é que o cronista Alcione Araújo que tanto encantava os seus leitores nas manhãs de segunda-feira, com a sua crônica no Jornal Estado de Minas, “encantou-se” em 15 de novembro de 2012, dia da Proclamação da República e pertíssimo de completar dez meses do falecimento de outro grande escritor mineiro, Bartolomeu Campos de Queirós, em 16 de janeiro deste ano. E eu lhe dizia que não havia dia melhor para as suas crônicas: segunda-feira, início da semana, quando muitos estão apáticos pela semana de trabalho que se inicia, abrir o jornal, pela manhã, antes de “pegar no batente” e dar com a prosa poética do Alcione, falando de pássaros, de mar, de amor, da chegada do outono, era o mesmo que se alimentar de coragem, de ânimo para dar sequência à vida… Alcione Araújo faleceu em um hotel de Belo Horizonte, após retornar de um evento em Ouro Preto. Por ironia do destino, nos braços da capital mineira.
Tal qual a ave marinha, alcíone, que mergulha para apanhar peixe, o escritor Alcione Araújo mergulhava fundo na literatura, pescando, para nós, seus leitores, as mais belas palavras.
As segundas-feiras mineiras não serão mais as mesmas, Alcione.
Amanheceremos vazios de você!

11 thoughts on “Alcione Araújo – Um pescador de palavras!

  1. Eu soube por este post do falecimento deste ícono de nossa literatura. Em agosto de 2011 encontrei-o na Jornada de Literatura em Passo Fundo, quando passei-lhe um abraço seu,Fátima. Ele estava tão bem. O que será que deu nele que se foi, no mesmo dia em que perdi um grande amigo de convivência pessoal aqui. 15 de novembro me deixa mesmo de luto. Resta a memória do grande cronista e todas as suas palavras escritas. A Jornada Passofundense ficará muito mais órfã também.

  2. Bela homenagem, Fátima. Nunca me esquecerei do quanto as palavras de Alcione Araújo me guiaram na Chapada dos Guimarães. Que a sua caravana da ilusão siga em frente, agora, além do horizonte.

  3. Numa época de cronistas que só querem ser rebeldes e, muitas vezes, "chulos", perder um escritor que ainda prezava pela riqueza literária e nos iluminava a manhã,como você descreveu, é um dó imenso. Belíssima homenagem e, pelo visto, bastante merecida!

  4. O que mais dizer depois de sua homenagem ao Alcione?
    Tomo a liberdade de reproduzir, aqui, um mail trocado com o Alcione.

    Belo Horizonte, 02 de janeiro de 2007.

    Prezado Alcione,

    Seu livro: Escritos na Água, presente no meu coração,
    presente de minha cunhada, (Fátima Soares Rodrigues) com uma bela dedicatória.
    Há muito você é alvo de nossos comentários, a cada nova
    crônica no jornal Estado de Minas: sentimentos semelhantes
    conclusões inteligentes e todo o confete que você merece.

    É muito bom reler, em livro, tuas crônicas e um tema me
    despertou atenção: O outono!
    Não quero me gabar não, mas sou um especialista em outonos,
    principalmente os do Rio.
    Vou dar-te algumas dicas na sua busca por ele, o lugar certo para
    achar o outono "físico" no Rio é o seguinte:

    Roteiro 1: Pegar a Barca na Praça XV, saltar em Niterói e ir
    até o Bairro São Domingos dá pra ir a pé.
    Período de encontro do Outono: 29 de março a 07 de abril.

    Roteiro 2: Pegar o lotação para a Gávea, saltar no Teatro Clara Nunes, ir para a rua do Oitis até o final.
    Período de encontro do Outono: 27 de março a 05 de abril.

    Eu pelo menos encontrei em vários outonos, o meu outono outono, nesses lugares e nesses períodos, encontrei outros outonos não tão expressivos, talvez fossem só físicos, mas aquele outono outono! De corpo e alma!
    Esse aí é como o sertão do Guimaraes Rosa: Tá dentro da gente!

    Por fim, "Há um lugar pra ser feliz sem ser em Paris, Outono no Rio".(Ed Motta).

    Um abraço e seja feliz em todas as estações, como um trem que sempre
    chega a cada estação.

    Célio Antonio Manso

    ———————————————————–
    Resposta do Alcione:
    Caríssimo Célio,

    Antes de mais, minhas desculpas pela demora da resposta. Estava em férias em lugar inacessível, voltei no último domingo, e só agora posso responder a sua amável mensagem. Aliás, amável diz pouco: inteligente e sensível é mais próximo da verdade. Creio que temos, de fato, o outono como tempo do deleite. Vou guardar a indicação de Niterói e, no próximo março-abril, ir ao bairro São Domingos. Agora, por incrível que pareça, o roteiro da rua dos Oitis eu já fiz. Tenho amigos que moram por ali, Oitis e Rubens Vaz, e costumo passear, ora à tarde, ora pela manhã, à sombra das castanheiras. E fiz isso várias vezes no outono. O mundo é menor do que a gente supõe e as semelhanças maiores do que se imagina. Vide o velho Rosa, paixão definitiva.

    Agradeço-lhe a delicadeza da mensagem e a generosidade das palavras. Aceite o meu abraço,

    Alcione

  5. Hoje eu reli essa tua homenagem ao exímio Alcione. É tocante, linda, decerto ele ia gostar demais. Obrigada por nos emocionar tanto, Amiga! Já estamos com saudades, decerto!

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