Noite fria de final de julho na capital mineira. Acordo mais de dez vezes para amparar a testa da minha filha que não para de vomitar. Confiro seguidamente a temperatura do seu corpo, constato que não há febre, e vou lhe dando soro. Pela manhã, ela consegue dormir.
Após o almoço, e ela à base de soro, sonolenta, cansada e fraca, apoia-se em mim para entrar no carro e ir ao hospital. Lá chegando, confiro o relógio: 14h. Pego senha, aguardo, dirijo-me ao guichê para a ficha, aguardo mais, até a médica nos atender. Relato os vômitos, e ela vai direto ao ponto: onde dói?
Apalpa a região abdominal, e a especialidade de clínica geral se resume a isso.
Senta-se diante do computador, solicita exame de sangue e urina, além de prescrever os medicamentos, e nos indica a sala para tal.
Sala ampla, com poltronas um pouco mais largas que a de aviões, conto 15, quatro vazias. Todos os pacientes com “acesso” na mão ou no braço. Confiro o relógio: 14h30.
Antes das 15h, o enfermeiro colhe o sangue e dirigimo-nos ao banheiro para colher a urina.
Na volta, o “acesso” no braço, que é menos dolorido. Duas bolsas: a menor com Dramin para o vômito, e Buscopan composto para a dor. Depois, a maior para hidratação.
Abro o meu livro (companheiro inseparável para qualquer coisa que me lembre ESPERA) e vou entrando na leitura, quando, aos poucos, vou entrando em sonolência pela noite maldormida. Fecho o livro, abro os ouvidos e os meus olhos passeiam pela sala e vejo três estações doentes: inverno, outono e verão. A minha filha é a única pertencente ao verão: 15 anos. Ali, a primavera não vigora. Com a exceção de dois idosos, eu e a minha filha que dorme, os outros mantêm o braço direito repousado com o “acesso” e o esquerdo apoiado no abdômen, com os dedos em constante movimento “acessando” o celular.
De frente a nós, uma mulher no outono, e outra no inverno: sua mãe. Conta à paciente ao lado, que a mãe estava assentada no sofá, em casa, e, ao se levantar, tropeçou no chinelo e caiu batendo a cabeça do lado direito da testa.
“Fiquei doidinha. Agora ela está bem, apenas aguardando o exame de tomografia. Vaso ruim não quebra, né, mãe?”
A mulher dirige o olhar à mãe que está sempre sorridente, e ameaça: “da próxima vez que você cair, mãe, eu vou te bater, para você deixar de me preocupar…”
Penso: que forma mais estúpida de ser carinhosa…
Meia hora depois, ela sai e retorna com um copo descartável com café com leite e um pão de queijo. Para em frente à mãe, toma um pouco do copo, entrega-o à mãe, e dá uma, duas, três mordidas no pão de queijo, enquanto a mãe mantém o outro braço estendido aguardando que ela lhe entregue. A filha, prestes a entregar o salgado, volta-o para a boca, enquanto lhe diz: “só mais um pedaço, tá mãe?”
E então eu vejo a mulher recolher menos da metade de um pequeno pão de queijo…
Rindo, a filha me olha e comenta: “toda vez que a levo para comer no restaurante, eu a deixo sentadinha e vou pôr a comida pra ela. Na volta, vou beliscando até chegar à mesa. Quando chego, o prato está pela metade…, mas ela come tudinho!!!!!!
Volto os meus olhos para outra senhora, já no início do inverno, confortavelmente, na poltrona, balançando uma das pernas cruzada sobre a outra, com o celular no ouvido, e esticando o outro braço para a enfermeira. Falando alto, conta que chegou ao aeroporto com a calcinha suja que até vazou na calça comprida, mas a mulher foi um encanto: lavou as calças e lhe entregou num saco plástico…
De repente, do outro lado da sala, um pouco distante, ouço um forte: PSIUUUUU!.
Viro o rosto e dou com outra no inverno, com o celular numa mão e o dedo da outra mão na boca, pedindo silêncio, sem olhar para a que falava alto.
Penso: será parente dela?
A outra diminui o tom, mas não se incomoda com a intrusa.
Pouco tempo depois, esta se levanta e vai até a “amiga”, passando uma ligação do seu celular.
A outra agradece e faz voz chorosa no celular, sem uma lágrima, agradecendo a “força”, e enfatizando que só não morreu porque Papai-do-Céu gosta muito dela…
De repente, um casal que estava no soro tem um acesso de riso, porque a mulher, ao trocar as pernas para ficar mais confortável, consegue mandar o sapato para longe…
E vejo a cor roxa das poltronas como azul-celeste…
Finalmente, a filha da mãe (sem maldade, leitor, pois, desconheço o nome dos pacientes) pergunta se pode me fazer uma pergunta PESSOAL.
Considerando a sala ampla e eu em frente a ela, conclui que seria PESSOAL/COLETIVA, mas concordei.
– Você está pensando em pintar o seu cabelo?
Respondi-lhe monossilabicamente: “Não”.
– Ah, bom!
E, então, ela acessou os seus conhecimentos cabeludos:
– É porque eu fiz um curso de visagismo, sabe? E, embora o cabelo branco para a maioria das mulheres passe uma imagem de descuido, e até de sujeira, porque parece que a pessoa não toma banho… igual barba de homem por fazer, sabe? Mas, no seu caso, não. Tô vendo, aqui, que, pelo seu tom de pele…, o cabelo branco fica bem em você.
Imediatamente, acessei minha lucidez ao concluir que ela fala uma coisa e pensa outra, mas ainda estou em dúvida se, quando deixar o hospital, devo entrar diretamente num salão de beleza…
Ántes de ir ao salão, melhor escrever uma crônica para a acompanhante crônica.
A se destacar a riqueza das descrições. ..
Ao ler, parece que estamos assistindo um vídeo.
Parabéns!
Que gostosura ler o texto!
Parabéns e obrigada, Laede, pelo voo!
Bjs
Livros são a melhor companhia quando a espera é tardia.
Mal o sabe essa geração dedo-na-tela.
Texto sinestésico. Coloriu com o belo som do silêncio a minha tarde careta.
This design is spectacular! You definitely know how to keep a reader amused. Between your wit and your videos, I was almost moved to start my own blog (well, almost…HaHa!) Great job. I really enjoyed what you had to say, and more than that, how you presented it. Too cool!
You made some nice points there. I looked on the internet for the issue and found most people will consent with your website.
Your enthusiasm is contagious, making it difficult not to be enthralled by the topics you explore.
Your writing strikes a chord with me on a deep note. It’s like you’re speaking directly to me!
Wow that was strange. I just wrote an really long comment but after I clicked submit my comment didn’t appear. Grrrr… well I’m not writing all that over again. Anyhow, just wanted to say wonderful blog!
Your write-up is a game-changer; it pushed my perspective.
excellent points altogether, you just gained a new reader. What would you recommend about your post that you made a few days ago? Any positive?
Thank you for sharing indeed great looking !
Nice i really enjoyed reading your blogs. Keep on posting. Thanks
A great post without any doubt.
Thank you so much for sharing this wonderful post with us.
Nice i really enjoyed reading your blogs. Keep on posting. Thanks
Thank you for sharing indeed great looking !
Nice i really enjoyed reading your blogs. Keep on posting. Thanks
A great post without any doubt.
The information shared is of top quality which has to get appreciated at all levels. Well done…
Your enthusiasm is contagious. It is challenging not to get excited about the topics you discuss.
Nice i really enjoyed reading your blogs. Keep on posting. Thanks
A great post without any doubt.
Nice i really enjoyed reading your blogs. Keep on posting. Thanks