Eterna companhia

             Madalena embala sua dor. Todas as manhãs, ela saúda o seu espelho e se veste para a vida. Despe a tristeza, contemplando os sulcos na face, causados pelos seus 90 anos. Ao seu lado, repousa Joana, fiel companheira de sua solidão. Joana não fala, não anda, apenas sorri. Sua expressão é a mesma desde quando chegou para fazer companhia à Madalena.
        Carinhosamente, Madalena lhe troca as roupas todos os dias, escova-lhe os longos cabelos, ajeita-lhe os sapatos, enquanto divide com ela as poucas novidades que lhe chegam pelos jornais e na TV.
            Passiva, Joana mantém-se sorridente.
           Madalena lhe conta segredos, revive a juventude, lhe fala dos amores antigos. Vez por outra, Madalena lhe toca o rosto e, carinhosamente, deposita um beijo na face rósea e fria de Joana. Depois, Madalena retira-se do quarto e se dedica a seus afazeres domésticos solitariamente. Lava, passa, cozinha, enquanto o rádio reaviva suas lembranças ao tocar as músicas do seu passado.
         À tarde, já livre de suas ocupações diárias, Madalena coloca Joana ao seu lado em frente à TV, enquanto a tarde se estende.
            A noite cai.
            Após o banho, Madalena ajeita o pijama em Joana e, logo, acomoda-a na cama.
            Dá-lhe um boa-noite, reza e adormece novamente.
            Nos dias sombrios em que Madalena se sente mais só, ela conversa mais com Joana.
Nunca lhe cobrou sequer uma palavra, pois Joana nunca a abandonou. Reconhece nela, a amiga fiel, que entende seus momentos de reclusão, seu saudosismo, sua solidão recolhida “para não pesar ninguém”.
       Certo dia, Madalena despertou assustada. Sonhara que Joana desaparecera. Uma angústia, um enorme sentimento de vazio, confirmado pela ausência de Joana ao conferir a cama.
            Madalena ergue-se num impulso à busca de Joana.
            No chão, de bruços, ao lado da cama, Joana estática.
            Madalena se alivia. Ergue Joana e a recoloca novamente na cama.
           Apesar do susto, o conforto: Joana continua ali: muda, estática, mas sorridente.   
         Madalena limpa-lhe o rosto e a beija feliz; afinal, não lhe tiraram Joana, tudo não passara de um pesadelo. Sua companheira de todos os dias, a boneca Joana, jamais a abandonará.
Fátima Soares Rodrigues

3.740 thoughts on “Eterna companhia

  1. Have you ever considered writing an e-book or guest authoring on other blogs? I have a blog based upon on the same ideas you discuss and would love to have you share some stories/information. I know my viewers would appreciate your work. If you’re even remotely interested, feel free to send me an e mail.|

  2. I have been exploring for a little bit for any high-quality articles or blog posts in this sort of area . Exploring in Yahoo I ultimately stumbled upon this web site. Reading this info So i’m satisfied to convey that I’ve an incredibly excellent uncanny feeling I discovered just what I needed. I so much definitely will make certain to do not put out of your mind this website and provides it a look on a constant basis.|

  3. Hmm it looks like your blog ate my first comment (it was extremely long) so I guess I’ll just sum it up what I wrote and say, I’m thoroughly enjoying your blog. I as well am an aspiring blog blogger but I’m still new to the whole thing. Do you have any tips and hints for newbie blog writers? I’d genuinely appreciate it.|

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Website